Book of Oberon
O Livro de Oberon é um manuscrito mágico inglês do século XVI que se insere no corpus da magia cerimonial cristã da Renascença tardia. Preservado anonimamente por séculos, o grimório foi editado e publicado em 2015 por Daniel Harms, James R. Clark e Joseph H. Peterson, tornando-se uma fonte primária de grande relevância para os estudos de história da magia ocidental, literatura esotérica e religião comparada.
Contexto histórico e cultural
Produzido no período elisabetano, o Livro de Oberon reflete uma confluência de tradições mágicas que estavam em circulação na Inglaterra renascentista: a astrologia judiciária, a angelologia cristã, a cabala prática, a magia salomônica e elementos do folclore europeu — especialmente relacionados ao mundo feérico.
Diferente de grimórios puramente demonológicos ou exclusivamente angelológicos, o Livro de Oberon apresenta um sistema mágico sincrético, onde as operações envolvem tanto a evocação de anjos como a interação com entidades feéricas, entre as quais se destaca Oberon, o rei das fadas. Tal presença confere à obra um caráter singular dentro do panorama dos grimórios renascentistas.
Conteúdo do manuscrito
O conteúdo do Livro de Oberon é extenso e estruturado em forma de compêndio prático para o mago cerimonial. Inclui:
• Rituais de invocação angelical, baseados em orações cristãs, consagrações e invocações formais.
• Evocações de espíritos e entidades feéricas, entre os quais Oberon, Mycob, e outros nomes cuja origem é obscura ou de caráter folclórico.
• Círculos mágicos, selos e nomes divinos, com fortes paralelos à literatura salomônica (Clavícula de Salomão, Heptameron, Ars Notoria).
• Receitas de feitiços e operações mágicas práticas, como encantamentos de invisibilidade, busca por tesouros ocultos, cura de enfermidades e proteção espiritual.
• Tabelas astrológicas e correspondências planetárias, indicando a utilização de astrologia eletiva para escolha de momentos propícios à prática.
O texto é permeado por um vocabulário teológico cristão, invocações em latim e construções ritualísticas que seguem modelos litúrgicos, demonstrando a tentativa de justificar a prática mágica dentro de uma cosmovisão teísta e ortodoxa.
A figura de Oberon no grimório
A presença de Oberon como espírito central no grimório é notável e inusitada. Embora tradicionalmente conhecido no folclore e na literatura cortesã como o “rei das fadas”, no Livro de Oberon, ele é tratado como uma entidade espiritual de autoridade, cujo papel parece oscilar entre um guia mágico, um espírito tutelar e um soberano de um reino intermediário entre o mundano e o celestial.
Sua invocação é cercada de solenidade, e os rituais a ele dedicados se assemelham, em estrutura e linguagem, às conjurações angelicais, sugerindo que sua natureza é tratada como numinosamente ambígua — não meramente elementar, mas dotada de poder espiritual autêntico.
Importância acadêmica
O Livro de Oberon fornece uma rara janela para a prática da magia cerimonial inglesa em um momento de transição entre a tradição medieval e o hermetismo da Renascença. Além de preservar conteúdos inéditos, ele documenta a recepção vernacular de ideias cabalísticas, astrologia e angelologia sob a ótica de praticantes não vinculados ao mundo universitário ou eclesiástico — magos letrados, porém inseridos num universo de manuscritos circulantes.
Ele também serve como objeto de estudo para o entendimento de como o imaginário feérico europeu foi absorvido por estruturas rituais formais, demonstrando um sincretismo entre o mágico popular e o cerimonialismo cristão.
Edição crítica e acesso moderno
A publicação moderna pela Llewellyn Publications, organizada por Harms, Clark e Peterson, apresenta uma edição diplomática do manuscrito, com notas críticas, comentários contextuais, tradução de trechos em latim e reprodução dos diagramas mágicos originais. Esta edição tem sido cada vez mais utilizada em cursos de pós-graduação e seminários dedicados à história da magia, literatura inglesa e filosofia renascentista.
Conclusão
O Livro de Oberon é uma fonte essencial para o estudo da magia renascentista em sua forma viva e prática. Ele demonstra como, no interior da tradição cristã europeia, práticas mágicas continuaram a ser elaboradas e executadas com sofisticação simbólica e rigor litúrgico. Sua combinação única de angelologia, feitiçaria popular e invocação de espíritos feéricos o torna uma peça rara e valiosa no acervo dos grimórios ocidentais.
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